ARTIGO PUBLICADO: Agressividade em equipes de futebol

Resumo

O objetivo desta investigação foi recolher e analisar dados sobre o comportamento agressivo dos jogadores de futebol dos escalões sénior e júnior de Portugal, mais especificamente comparar índices de agressividade em relação à posição do jogador e aos anos de prática do jogador na modalidade. Para o efeito foram estudados 125 jogadores seniores que participaram na 1a Liga do Campeonato Nacional de Portugal e 88 jogadores do escalão júnior das duas subdivisões (17 e 18). Para a recolha dos dados foram utilizados o Bredemeier Athletic Aggression Inventory (BAAGI) e um questionário informativo sobre dados pessoais e da carreira desportiva dos atletas. Os resultados demonstraram existir diferenças estatisticamente significativas entre os jogadores seniores em relação aos jogadores juniores na dimensão reativa ou hostil da agressividade. A apreciação dos valores descritivos informa que, quanto maior é o número de anos de competição, maiores são os índices de agressividade apresentados pelos atletas.

Introdução


Os eventos desportivos representam um fenômeno sociocultural complexo cuja compreensão e explicação não é fácil. Embora tenham sido realizadas várias investigações em torno do fenómeno de violência e da agressividade em contexto desportivo (1, 8, 6, 9, 5), ainda é difícil compreender toda a extensão destes fenómenos. Estes comportamentos e emoções são vivenciados por pessoas que participam da competição, por atletas e por acompanhantes que compõem o cenário do desporto, ou seja, os treinadores, os familiares, os árbitros e, até, os meios de comunicação. Como salienta Thirer (16) é importante o estudo do fenômeno da agressão no desporto infantil, amador e na alta competição, versando os adeptos e os jogadores.

É importante ressaltar que o estudo da agressão tem contado, além da contribuição da psicologia, com estudos da biologia, da antropologia e da sociologia, entre outros. Na revisão da literatura (7, 13, 15, 10, 4) referente ao conceito de agressividade e violência, percebemos que existem diferentes interpretações em relação a esse assunto. As várias abordagens e atributos teóricos justificam essa diversidade conceptual.

Para os propósitos deste trabalho, adotamos a visão de Bredemeier (3). Na distinção do comportamento agressivo e violento, esta investigadora afirma que o comportamento agressivo no desporto é “o início intencional do comportamento violento e prejudicial”. ‘Violento’ significa qualquer ofensa física, verbal ou não verbal, enquanto ‘comportamento para causar dano’
quer dizer qualquer intenção ou ação prejudicial” (3, p. 43). A autora complementa que, uma falta acidental ou lesão a outro atleta provocada pela falta de habilidade, não será considerada agressão; uma falta intencional, mesmo que daí não resulte em prejuízo ou lesão para o outro atleta, é considerada uma agressão no desporto.

Para uma melhor compreensão do tema, recorremos ao trabalho de Samulski (13) que apresenta a agressão como hostil ou reactiva e instrumental. A agressividade hostil ou reativa tem a intenção explícita de prejudicar ou lesar o adversário, enquanto a agressão instrumental está relacionada a uma determinada situação do jogo que pode envolver o dano ao adversário com o intuito de alcançar as suas próprias metas (ex. ganhar um jogo) ou impedir que outra pessoa alcance as suas metas (ex. impedir um chute ao gol). Conforme complementa Geen (7), a agressão instrumental pode envolver uma forte emoção, mas é basicamente motivada por interesses diferentes de prejudicar o outro.

A realidade é que ambas as formas de agressões, hostis ou reactivas e instrumentais, estão relacionadas às metas ou objetivos a atingir. O que as diferencia é que a primeira necessariamente tem como meta causar dano ao adversário, enquanto a segunda pode envolver o dano ao adversário, mas a intenção está relacionada com o alcançar de um determinado resultado desportivo positivo ou favorável.

É dentro desse contexto que Bredemeier (2,3) define a agressão atlética como o início de um ataque dentro do mundo esportivo, mais especificamente, podem ser consideradas agressões que ocorrem dentro do desporto competitivo.

Samulski (12) indica que a origem dos comportamentos agressivos nos jogos está associada com a importância dos mesmos para o rendimento dos atletas e das equipas, acrescentando outras variáveis intervenientes como a posição e a tarefa tática do jogador, o comportamento do árbitro e dos treinadores, o comportamento e dimensão das claques ou às próprias das regras desportivas. Nesse sentido, a avaliação cognitiva que o atleta faz do jogo e o “peso” que cada competição tem para ele contribuem para o comportamento agressivo. Ryan, Williams e Wimer (11) concluíram que, conferir legitimidade a atos agressivos, é mais freqüente em jogadores de basquete do primeiro ano do que em jogadores experientes, mas a avaliação da agressividade manifestada pelos participantes do primeiro ano, no fim da época, aponta para um nível mais baixo do que o nível atingido nas equipas experientes.

Os jogadores agressivos costumam receber um tratamento de destaque no noticiário, o que provoca a associação de agressão-destaque. Esta associação, por vezes, torna-se um factor motivador ou de reforço para perpetuar o comportamento agressivo (9). Portanto, podemos considerar que o próprio modo como os meios de comunicação apresentam as notícias nos jornais e em particular na televisão sobre os acontecimentos desportivos, em particular a agressividade, pode favorecer a adesão a esse tipo de comportamentos por parte dos atletas e do público em geral. As palavras utilizadas pelos atletas e jornalistas em torno de comportamentos agressivos explícitos nos jogos geram uma atmosfera agressiva e violenta ao longo de toda uma época.

No presente estudo pretendemos contribuir para o entendimento da prática do comportamento agressivo e as frequentes manifestações desses comportamentos na modalidade do futebol. Com isso, podemos não só contribuir para o campo da psicologia do desporto, como também para a atuação e formação dos treinadores e atletas. Para além de explorar os factores que podem influenciar a prática desse comportamento, esperamos com este estudo contribuir com alguns dados que possam reforçar atitudes preventivas dos responsáveis e dos Divisão atletas em torno da agressividade no desporto.

De acordo com o enunciado, definimos como objetivo geral do estudo recolher e analisar dados sobre o comportamento agressivo dos jogadores da modalidade futebol dos escalões sénior e júnior de Portugal. Em termos de objetivos mais específicos pretendemos comparar índices de agressividade em relação à posição do jogador e aos anos de prática do jogador na modalidade.

Bidutte, L. C.; Azzi, R. G.; Raposo, J. V.; Almeida, L. (2006). Agressividade em equipas de futebol. Motricidade 2 (1): 13-22

REFERÊNCIAS

1 – Bandura A (1991). Social cognitive theory of moral thought and action. In Kurtines WN & Gewirtz JL (Eds.), Handbook of moral behavior and development. Hillsdale, NJ: Erlbaum, 45-113. 

2 – Bredemeier BJ (1975). The assessment of reactive and instrumental athletic aggression. In Landers D M (Ed.), Psychology of sport and motor behaviour-II. State College, PA: Penn State HPER Series, 71-83. 

3 – Bredemeier B (1983). Athletic aggression: A moral concern. In Goldstein J. (Ed.), Sports violence. New York: Springer-Verlag, 42-81. 

4 – Buss AH (1961). The psychology of aggression. New York: Wiley. 

5 – Cruz JF Barbosa LG & Gomes AR (1997). Ava- liação do stress e confronto psicológico na alta com- petição desportiva: Desenvolvimento e adaptação de instrumentos. In Actas da Conferência Internacio nal “Avaliação Psicológica: Formas e contextos”. Braga: APPOT. 

6 – Dunn JGH & Dunn JC (1999). Goal orientations, perceptions of aggressive, and sportspersonship in elite male youth ice hockey players. The Sport Psychologist, 13:183-200. 

7 – Geen RG (1998). Processes and personal variables in affective aggression. In Geen RG & Donnerstein E (Eds.), Human Aggression. San Diego, CA: Academic Press, 1-21. 

8 – Kirker B. Tenenbaum G & Mattson J (2000). An investigation of the dynamics of aggression: Direct observations in ice hockey and basketball. Research Quarterly for Exercise and Sport, 71 (4): 373-386. 

9 – Machado AA (1998). Interferência da torcida na ansiedade e agressividade de atletas adolescentes. Tese de Livre Docência. Universidade do Estado de São Paulo, Rio Claro (Não publicado). 

10 – Ruis HHB (1998). Futebol e Sociedade: As manifes- tações da torcida. Tese de Doutorado. Universidade Esta- dual de Campinas, Campinas (Não publicado). 

11 – Ryan M K, Williams JM. & Wimer B (1990). Athletic aggression: Perceived legitimacy and beha- vioral intentions in girl’s high school basketball. Jour- nal of Sport and Exercise Psychology, 12: 48-55. 

12 – Samulski D (1995). Psicologia do esporte: Teoria e aplicação prática. UFMG, Belo Horizonte: Imprensa Universitária. 

13 – Samulski D (2002). Psicologia do Esporte. São Paulo: Manole. 

14 – Silva, PMS (2000). Espírito desportivo e agres- sividade: um estudo com alunos do 20 e 30 ciclo do ensino básico. Tese de Mestrado. Faculdade de Motri- cidade Humana. Lisboa. 

15 – Silva III JM & Stevens DE (2002). Psychological Foundations of Sport Boston. Allyn & Bacon. 

16 – Thirer J (1993). Aggression. In Singer RN, Mur- phey M & Tennant LK (Eds.), Handbook of research on sport psychology. Canadá: MacMillan, 365-378.